Visão do Direito

Novo Código Eleitoral: o que mudará nas eleições?

"O Brasil já apresentou, no decorrer de sua história, cinco códigos eleitorais. Com a aprovação do projeto de lei n. 112 de 2021, deteremos um novo compilado de regras composto por 896 artigos"

Giancarlo Fontoura Donato, membro da Comissão de Direito Eleitoral da OAB/DF e especializando em direito eleitoral pela Verbo Jurídico
 -  (crédito: Divulgação)
Giancarlo Fontoura Donato, membro da Comissão de Direito Eleitoral da OAB/DF e especializando em direito eleitoral pela Verbo Jurídico - (crédito: Divulgação)

Por Giancarlo Fontoura Donato* — Estaria a sociedade realmente preparada para o novo Código Eleitoral que entrará em vigor no próximo ano e que, por conseguinte, afetará sobremaneira o cenário democrático a partir de 2026? Começo este artigo com a indagação, norteado pelas valorosas palavras de Louis Maria de la Haye, Visconde de Cormenin, citado por Manoel Rodrigues Ferreira: "A Constituição é a sociedade em repouso; a lei eleitoral, a sociedade em marcha".

Para respondermos à indagação inicial, faz-se absolutamente necessário compreendermos o marchar da sociedade, entendermos em que momento estamos enquanto tal e em que sentido queremos — ou devemos — partir. Tal compreensão pera por assimilar o que está sendo gestado no Congresso Nacional. Pois bem. O cenário eleitoral presente é composto por amplo regramento. Já possuímos um código eleitoral com 383 artigos. O Brasil já apresentou, no decorrer de sua história, cinco códigos eleitorais. Com a aprovação do projeto de lei n. 112 de 2021, deteremos um novo compilado de regras composto por 896 artigos.

À medida que evoluímos enquanto sociedade, nossa legislação deve acompanhar o processo. No entanto, nem sempre as alterações são unânimes. Pelo contrário, usualmente divergências de entendimento acabam por surgir, e assim o é em qualquer sociedade plural. Já adianto, portanto, que teremos pontos extremamente polêmicos que ainda serão discutidos no âmbito do Poder Judiciário, como a unificação das eleições a partir de 2034.

Além disso, uma novidade significativa — e polêmica — será o fim das reeleições. No tópico supracitado, questionamentos pontuais surgem: como ficará o período de mandato dos principais cargos eletivos de nosso sistema, os cargos de chefe do Executivo em suas variadas esferas? A proposta é que o período de mandato para os cargos de presidente da república, governador e prefeito seja de cinco anos. Ademais, o período seria o mesmo para cargos do Poder Legislativo, exceto Senadores - esses últimos com novel mandato de 10 anos. Mudanças acertadas? A experiência e o tempo responderão.

Ainda sobre mudanças, muitas ocorreram ao longo de nossa maturação democrática.

Alterações importantes, que moldaram nosso sistema atual. A título de exemplo, tivemos: a criação da Justiça Eleitoral, o início do voto feminino, o voto secreto (Código de 1932), a atuação do Ministério Público e a redução da idade mínima para votar aos 18 anos (Código de 1935), a proibição de candidatura avulsa (Código de 1945), a instituição da cédula única de votação (Código de 1950), e a anulação geral de eleições e perda de diplomas (já no código atual de 1965, advindo da reforma de 2015).

Anos

A nova legislação também visa unificar uma série de normas dispersas, substituindo a Lei 4.737, de 15 de julho de 1965 (Código Eleitoral), a Lei nº 6.091, de 15 de agosto de 1974 (sobre o fornecimento gratuito de transporte a eleitores nas zonas rurais), a Lei Complementar 64, de 18 de maio de 1990 (Lei de Inelegibilidade), a Lei 9.096, de 19 de setembro de 1995 (Lei dos Partidos Políticos), a Lei nº 9.504, de 30 de setembro de 1997 (Lei das Eleições), a Lei 9.709, de 18 de novembro de 1998 (Lei do plebiscito, referendo e iniciativa popular), e a Lei n° 14.192, de 4 de agosto de 2021 (Lei de combate à violência política contra a mulher).

Entre as inovações, destaca-se o princípio do in dubio pro sufrágio (previsto no art. 2º, inciso X, do Código Eleitoral que tramita na Câmara Alta), a liberdade de expressão como garantia ampla no processo eleitoral (art. 2º, II do novo CE), e a mudança no regime de contratação dentro dos Partidos Políticos, que ará a ser por cargo comissionado. A fiscalização das fundações partidárias, que atualmente é realizada pelo TSE, ará a ser de competência do Ministério Público Estadual (conforme emenda 87 prevista no parecer apresentado).

Muitos são os pontos a serem destacados no novel projeto. Todavia, alguns saltam aos olhos, considerando sua recorrência: palavras "fraude", "gênero" e "mulher(es)", que aparecem 192 vezes no novo texto, evidenciam a preocupação do legislador com temas relevantes no país, como a fraude à cota de gênero. Um progresso importante também é a introdução no artigo 850, parágrafo único, que prevê as regras do Juiz das Garantias, uma implementação recente e convalidada em agosto de 2023 pelo Supremo Tribunal Federal.

Outro aspecto a ser ressaltado é o período de inelegibilidades e desincompatibilização, que terá uma data única: 2 de abril do ano eleitoral, e o prazo máximo de inelegibilidade será de oito anos. Além disso, o novo Código Eleitoral prevê crimes com penas severas, como extorsão eleitoral (art. 867) e falsificação de resultado (art. 873), com penas máximas de 10 anos.

Destaca-se também a criminalização da divulgação de fatos inverídicos (art. 859), que poderá resultar em pena de um a quatro anos e multa. Entretanto, o legislador peca ao não legislar de forma específica sobre os procedimentos para as duas ações mais relevantes no direito eleitoral: a Ação de Investigação Judicial

Eleitoral (AIJE) e a Ação de Impugnação de Mandato Eletivo (Aime), que continuarão a ser interpretadas à luz das resoluções do Tribunal Superior Eleitoral e de sua jurisprudência.

Outros pontos relevantes merecem uma análise mais aprofundada, como financiamento e prestação de contas, a propaganda eleitoral na pré-campanha e a questão das nulidades das eleições no âmbito do Poder Executivo para municípios com menos de 200 mil eleitores. Atualmente, a Lei 13.165/2019, ao modificar o art. 224, § 3º do CE, prevê a realização de novas eleições. Com o novo Código Eleitoral, segundo o parecer do Senado, será dada posse ao candidato com maior votação entre os votos remanescentes válidos.

Considerando o exposto, reitero o questionamento: estaria a sociedade realmente preparada para o novo Código Eleitoral? Em um período de graves turbulências, pelos mais variados motivos, uma mudança de ímpar magnitude exsurgirá, com ou sem resposta definitiva ao questionamento. Porém, é certo: para enfrentarmos os tempos vindouros, precisaremos de união em prol da República Federativa. Somente assim, unidos e com ideais e pensamentos propositivos, avançaremos pela evolução concreta de nossa nação.

Membro da Comissão de Direito Eleitoral da OAB/DF e especializando em direito eleitoral pela Verbo Jurídico*

 

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Por Opinião
postado em 12/06/2025 03:00
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